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Rompendo o Silêncio: Entrevista com Roque JR

O “Rompendo o Silêncio” teve a honra de entrevistar o fotógrafo, editor e escritor Roque JR.


Roque JR escreve desde os 12 anos, tem 48 obras publicadas e 100 em processo de aperfeiçoamento ou aguardando impressão. O escritor destaca em seus textos a bipolaridade, Saúde Mental, Luta Antimanicomial, entre outros temas. É um nome muito requisitado para falar a respeito das temáticas citadas, tendo sido premiado e participado de inúmeras conferências, eventos, exposições e palestras pelo país.



A sua escrita é transformadora por levar ao público informações importantes e o conhecimento adequado acerca da temática da luta antimanicomial. De que forma a escrita move a sua vida?

A escrita tem me acompanhado desde minha infância, com uns 12 anos de idade já tinha enviado diversas correspondências a muitos familiares. Com o tempo, me interessei pelo jornalismo, enviando correspondências para vários jornais, que foram publicadas e, logo em seguida, com 17 anos de idade, já trabalhava na redação de um jornal semanal e local. A escrita continuou em minha vida durante várias décadas, auxiliando jornais como repórter fotográfico, quando produzia as imagens, e vários releases que se transformaram em centenas de matérias. Passei por alguns jornais impressos de Farroupilha-RS, outras participações estaduais e nacionais. Paralelo a isso, escrevia muito em meus diários, poesias, mais de 150 crônicas publicadas, entre tantas outras formas de textos.

Atualmente, estou me aproximando do meu 50º livro publicado. Sinopses, os próprios livros, entre tantos outros detalhes estão em meu site.

Inclusive 17 e-livros, em PDF, totalmente gratuitos, sem nenhuma contrapartida ou cadastro. E o maior detalhe, que além de gostar muito da escrita, a utilizo como terapia. Sem contar que direta e indiretamente auxilia muitas pessoas pelas informações nelas publicadas.



Livro "Militância na Luta Antimanicomial e na bipolaridade. Autoria: Roque JR

Livro "Militância na Luta Antimanicomial e na bipolaridade. Autoria: Roque JR


Uma reportagem de Hiram Firmino impulsionou o fim dos horrores no manicômio de Barbacena, em Minas Gerais. Foi em 1979, um ano após a revogação do AI-5, que ele conseguiu entrar pela primeira vez no Hospital Colônia, o manicômio de Barbacena, em Minas Gerais, e descrever tudo o que viu ao jornal "O Estado de Minas". Devido à época, ele teve dificuldades para escrever por receio em ser censurado. Disse até que sua tática era escrever textos mais fraquinhos, sem parecer uma denúncia. Porém, graças à reportagem, começou ali uma mudança de paradigma para a saúde mental. Qual é a importância da escrita para colocar luz a esse tema super necessário e ainda tão pouco debatido na sociedade?

A escrita sempre é algo importante desde os primórdios, desde o que sabemos ser sua origem. Se não tivéssemos perdido tantos escritos da Biblioteca de Alexandria, se muitos pesquisadores tivessem acessos a certos livros que tiveram pouca tiragem, muitos assuntos estariam mais avançados atualmente. A escrita retrata o momento, o cotidiano, e mostra os avanços e retrocessos daquele momento histórico. Sou suspeito na afirmação em ser muito importante a escrita, mas não podemos citar de outra forma.

Alguns capítulos podem fazer a diferença numa dissertação, numa tese, em um livro em geral. Mas todos têm seu legado a ser transmitido. Com relação à Luta Antimanicomial, não poderia ser diferente. Muitos detalhes que são passados em dezenas e dezenas de livros publicados sobre o assunto, vão moldando as mudanças da Sociedade Sem Manicômios.

Na realidade, muitos grupos procuram debater o tema junto à sociedade em geral - nas Conferências de Saúde (nas três esferas governamentais), nos Conselhos de Saúde, também das três esferas (municipal, estadual e nacional), em tantos outros conselhos e esferas, como o de Psicologia e Assistência Social. Também nos Núcleos de Luta Antimanicomial que estão espalhados pelo Brasil e a própria RENILA Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial. É importante lembrar que próximo ao 18 de maio, Dia Nacional de Luta Antimanicomial, muitos locais do Brasil multiplicam atividades no tema. Em outras datas, como festividades, que lembram as vitórias alcançadas com a diminuição de leitos em manicômios, da comemoração da primeira lei antimanicomial do Brasil e a segunda da América Latina, que foi aqui no Rio Grande do Sul, em 1992. Lembrar que muitas atividades Brasil afora comemoram avanços da Luta Antimanicomial como o Mental Tchê, no município de São Lourenço do Sul, e a Parada Gaúcha do Orgulho Louco, no município de Alegrete, ambos aqui no RS. Poderia citar várias outras atividades neste Brasilzão, mas certamente outros entrevistados e participantes citarão. Concordo que deve ser mais debatido pela sociedade como um todo.


Internados eram obrigados a ficar no pátio das 5h às 19h, sem fazer nada, todo os dias. Foto: Divulgação/Luiz Alfredo/Revista O Cruzeiro


“Silêncio dos Afogados” traz o universo dos manicômios e da saúde mental no Brasil no século XX. Você acha que o cinema, a TV e internet têm um papel social de promover algum tipo de reflexão?

Não apenas acho, como divulgo, publico em meus livros muitos destaques que ocorrem em filmes e novelas. Já perdi a conta de quantas novelas de “várias épocas”, de vários canais, junto com outros tantos filmes que possuem em seu roteiro os hospícios, manicômios, junto aos seus personagens. Alguns tratam com mais visão da Luta Antimanicomial outros tratam com o foco de momentos tristes, ainda antes de avanços da Reforma Psiquiátrica Antimanicomial e a Reforma Sanitária. Com certeza há o papel social, de questionamento, pela TV, internet, cinema, Literatura e outras formas em desconstruir muita mentalidade equivocada no assunto.

Qual a importância do Estado e da sociedade no cuidado de usuários de saúde mental?

O Estado deve dar o máximo de atenção, recursos, formação aos profissionais e trabalhadores. O Estado também deve manter os CAPS Centro Psicossociais e a RAPS com total estrutura para não necessitar a internação em leitos de hospitais gerais, muito menos em hospícios, manicômios ainda existentes. Os CAPS III (24horas) devem estar preparados para dar sustentação aos usuários do SUS que necessitem algum cuidado e não conseguem retornar para casa por alguns dias.

Lembrando que a internação, quando realmente necessária e que não se pode evitar, não deve exceder 16 dias de internação. O Estado não pode financiar alternativas manicomiais, de hospícios, com as verbas destinadas aos CAPS, como infelizmente está ocorrendo com as Comunidades Terapêuticas - CTs, que são atuais manicômios pela sua forma asilar de cuidado e com financiamento do Estado, enquanto centenas de CAPS não têm profissionais e trabalhadores, e materiais em geral para o tratamento em liberdade.

Quanto à sociedade, tem a obrigação de acompanhar, seja pelo controle social, seja pelos usuários e familiares, o trabalho realizado junto aos usuários do SUS. Existem muitos grupos no interior dos CAPS para dar sustentação através de profissionais e trabalhadores cada vez mais preparados para proporcionar uma vida em liberdade aos que possuem algum problema com Saúde Mental. A sociedade pode proporcionar algum tipo de terapia, ampliando as que são ofertadas pelos CAPS. Os familiares precisam acompanhar os grupos dos CAPS para entender melhor as formas que os usuários de Saúde Mental precisam ter de atenção, de cuidado em remédios e outros detalhes.

Qual a mensagem da luta antimanicomial no Brasil?

A Luta é algo que teremos que ter por algumas décadas ainda. Infelizmente, muitos profissionais e trabalhadores da Saúde, Saúde Mental e outras áreas que tratam dos usuários do SUS necessitam mais preparo. Houve épocas que o Estado dava mais formação, dava mais condições de atuação na Saúde Mental. Estava se dirigindo para algo mais próximo do ideal, mas houve muitos retrocessos. Esses retrocessos agravaram muitos setores e o cuidado em liberdade está comprometido em muitos locais, em especial junto às Comunidades Terapêuticas – CTs, que deixam pessoas asiladas por seis, nove meses, e ao saírem de lá poucos se recuperam, sem contar que a verba acaba deixando de ir para setores como os CAPS, onde atualmente necessitam de muita atenção financeira, de recursos humanos e do Estado.



Livro: ":): a importância da Psicoterapia e da Luta Antimanicomial". Autoria: Roque JR

Como seria um mundo ideal para o sistema de saúde mental e da luta antimanicomial?

O mundo ideal seria o que fez Basaglia, vi que utilizou frase dele neste projeto. Basaglia conseguiu fechar todos manicômios da Itália. Apenas em hospitais gerais haviam leitos para o cuidado em Saúde Mental. No Brasil, a ideia inicial era construir, a partir da Lei Antimanicomial de 2001, a criação de CAPS suficiente para o fechamento de todos os hospitais, clínicas psiquiátricas. Mas esta é uma Luta grande. Acredito que verei isso se concretizar, não haver nenhum hospital, clínica psiquiátrica ou mesmo Comunidade Terapêutica em funcionamento no Brasil.

Você pode conferir mais das obras de Roque JR nos sites:


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